Sacerdote não pode cair no ativismo, adverte bispo

Leonardo Meira
Da Redação

A função e o ser do sacerdote não são duas esferas distantes uma da outra. Ao contrário, se sustentam e devem andar de mãos dadas. "A cultura contemporânea insiste sobre o ativismo. [...] Na experiência do sacerdote, o agir é manifestar o ser. Age diferentemente quem é diferente", defende o Bispo de Petrópolis, Dom Filippo Santoro.

Dom Filippo é um dos palestrantes no Congresso Teológico Internacional "Fidelidade de Cristo, Fidelidade do Sacerdote", que acontece na quinta, 11, e sexta-feira, 12. A Sala Magna da Pontifícia Universidade Lateranense sedia o evento, que também pode ser acompanhado pela internet através do endereço - www.convegnoteologico.org/es

Nesta entrevista exclusiva ao noticias.cancaonova.com, Dom Filippo fala sobre o tema de sua palestra, "Do ser do sacerdote à sua função para a missão". O bispo enfatiza o que precisa ser valorizado na formação dos seminaristas e de que forma os padres podem atuar sem cair no ativismo, esquecendo a origem de seu fazer.

.: Ouça a entrevista com o Bispo de Petrópolis, Dom Filippo Santoro

noticias.cancaonova.com - Dom Filippo, qual tema o senhor abordará no Congresso?

Dom Filippo Santoro - Fiquei muito contente por ser convidado. O tema que me foi indicado e eu desenvolvi é "Do ser do sacerdote à sua função para a missão" - aborda a questão de que a missão sacerdotal, o ministério sacerdotal, nasce do fato de que o sacerdote é sinal de Cristo Jesus, Bom pastor.

Do próprio ser do sacerdote nasce a missão, nasce o ministério. Achei o tema muito rico, porque nosso ser missionário nasce do "ser". Nosso "ser" é uma coisa só com Jesus. É aí que desenvolvo toda essa ligação entre a configuração a Cristo, Sumo e Eterno Sacerdote, e nossa manifestação pública do que somos, por meio do ministério e da atividade missionária.

É claro que isso não acontece automaticamente: não basta a pura e simples ordenação, é necessário uma preparação, durante o tempo do seminário, para a vida missionária. O padre não deve ser preparado apenas para o culto, ou para organizar pastorais; deve ser preparado para ser missionário, levar a presença de Jesus para o meio das pessoas e torná-las apaixonadas pelo encontro com o Senhor.


noticias.cancaonova.com - O senhor enfatizou a questão do seminário. O que o senhor acredita que deva ser enriquecido nas casas de formação?

Dom Filippo - Duas coisas. Por um lado, uma preparação que não seja apenas teórica, doutrinária, mas uma profunda experiência de unidade com jesus, porque o sacerdócio de Jesus nasce do fato de que Cristo se oferece na cruz totalmente ao Pai e ao homem. Então, a formação deve educar os jovens a se entregar, a participar dessa oferta da vida, como Jesus. Participar do sacrifício. O centro da vida do padre é a Missa. O centro da Missa é a oferta de Cristo, na morte e na ressureição.

Por outro lado, não apenas ficar no momento litúrgico, no momento do padre que organiza as pastorais, mas daquele que é missionário e comunica, na praça, na rua, onde as pessoas vivem, a beleza de Cristo. Então, a profunda intimidade com a oferta de Jesus, o sacríficio, e, ao mesmo tempo, esta profunda dimensão missionária, comunicar o Senhor na vida, não apenas nas celebrações.


noticias.cancaonova.com - Na sociedade, existe uma ideia muito funcionalista das coisas, em que tudo é medido de acordo com as suas funções. Com base no tema da sua palestra, poderíamos dizer que o "ser" do sacerdote deve estar profundamente vinculado à sua função, e que as duas coisas estão relacionadas de modo recíproco e se sustentam, de certa maneira?

Dom Filippo - Certamente, porque a cultura contemporânea insiste sobre a função, o fazer, o ativismo, esquecendo qual a origem do nosso fazer, do nosso atuar, da nossa dedicação. Então, faço uma introdução sobre a filosofia da práxis [prática], que é apresentada como a primeira coisa, de tal modo que a verdade vem depois. Não é assim.

Em nossa experiência, também racional, o ser vem antes do agir. Age diferentemente quem é diferente. Na vida sacerdotal, o agir não é puro ativismo; o ser é esta identificação cheia de paixão com Jesus que chama, que diz "Deixa tudo, deixa tuas redes, vem comigo". Se assimila um ser novo. Não é a filosofia da práxis, mas a experiência do amor de cristo que se traduz em ação, práxis nova, por meio do testemunho e da entrega da vida.

Há todo um desafio da cultura modena, que elimina o ser para o puro agir, e é aí que as pessoas se perdem. Pensando em fazer o bem, ficam perdidos. Enquanto na experiência do sacerdote, o agir é manifestar o ser, a festa do encontro com o Senhor.


noticias.cancaonova.com - O senhor aponta alguma saída prática para que esse "agir que segue o ser" possa ser manifestado?

Dom Filippo - São dois aspectos importantes. Primeiro, no nível do pensamento, porque os erros acontecem, sobretudo, na maneira de pensar. Muitas pessoas pensam que a função seja a coisa mais importante, enquanto não é assim.

A questão do pensamento é muito importante, porque a forma de pensar é funcionalista, ativista, fazendo coisas sem sentido. Então, educar a maneira de pensar, porque nossa vida, nossa vocação tem uma origem, que é a pessoa de Cristo, que nos revela a origem maior ainda, que é o amor do Pai. Nós não estamos no mundo como frutos do acaso, temos uma origem grandiosa, o infinito amor de Deus.

O outro ponto é no nível da educação; insisto muito no trabalho educativo. Ajudar os jovens, em particular os presbíteros, a perceber que não é fazendo, mas sendo filhos, sendo padres, reconhecendo a beleza do sacerdocio, o primado do amor de Cristo, que se encontra sentido. A insistência sobre a educação, seja no seminário, seja depois, através dos encontros formativos permanentes, ajuda a pensar na beleza da nossa vocação, e na atividade que é manifestação da vida.

Assim, a missão não será fazer coisas, mas manifestar o que nos aconteceu na vida cotidiana, através do ministério.


noticias.cancaonova.com - Seria exatamente devido a essa mentalidade - a vocação que cai na esfera do fazer - que muitos padres ficam desmotivados, o que traz reflexos para as comunidades?

Dom Filippo - Certo, porque se tudo depende do fazer coisas, o sacerdote coloca sua esperança no resultado. Quando o resultado não aparece, fica desanimado; quando o resultado aparece, fica orgulhoso do que fez. Enquanto que a satisfação da pessoa não está no resultado, no ativismo, mas, sim, no pertencer ao Senhor. Se uma pessoa tem essa satisfação, a atividade, o trabalho, será muito melhor; não será mais calcular resultado e ficar desanimado, de tal modo que as comunidades também ficam desanimadas, ao verem um padre que reza a missa sem entusiasmo, sem brilho.

Deve-se valorizar a identidade que nos caracteriza e sustenta.


noticias.cancaonova.com - Gostaríamos que o senhor comentasse sobre a importância desse Ano Sacerdotal e que frutos o senhor espera que o Congresso Teológico traga para os sacerdotes do mundo todo?

Dom Filippo - É uma graça incomparável. O Papa quer que seja o ano em que os padres tomem consciência de sua imensa, infinita dignidade: ser sinais de Cristo Bom pastor. É o padre tomar consciência de que é esse anuciador da palavra, esse celebrador dos sacramentos que alimentam o povo.

Este Congresso Teológico ajuda exatamente na forma de pensar, de considerar o sacerdote, de valorizar a vida. Teremos uma série de palestras extraordinárias. Será um congresso de grandiosa importância, porque ilumina a mente do sacerdote e do povo de Deus, e esquenta o coração. Com certeza, será um momento de cultura e de vida para a maior santificação dos nossos padres.

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